sábado, 24 de setembro de 2011

Ser um cão



Conheço na porta um cão, no vão de nove e meia. Canta comigo cantigas de ontem, a me ver, em mim, animal passeia. Era sorte, era a morte, batendo aa porta, o carvalho, o toc, o toque. Lembrava o campo, que não cresci. Lembrou o concreto em que vivi.

Lá vi, segundos passados poucos, mais sossego, patas moverem-se de vez  em vez adentro, na forma de mãos, dez dedos apertando, apelos e olás. Caninos no sorriso, sorrisos caninos meus. Meu rastro rosnador, era ele, era eu, espelho amargo do ontem.

Que me contem, num mote, que veria assim labrador, fila ou mastim. Dálmata, de palma preta. Chiuaua au au. Basset ranheta. Não, não veria, tomba lixos, vira-lata, cão canastra. Mestiço místico. Milagre em cores multipálidas, multivívidas, miscigenadas, vivendo de cuspe e caridade.

Carecendo apresentar, os olhos pretos sórdidos, os olhos puros do mestiço. Vendo um mundo humano, agora, polegar opositor. Nunca opondo, nem depondo a malandragem, a dragagem, passado precisado para - o sobrevivendo então, vendo agora as cores sem preço. Triste d'a chuva não as ter.

Atém em mim o minuto. Bacantes tratantes cantam. Nossas formas, bossas, ateus. Passos no passeio sem raça. Passos nossos, nesse deenea meu e teu. Mas sabemos de Valquírias, a subir nesse céu a cantar na pós batalha, antevisita, antecanina, ontem humano. Lançando restos de banquete em meu tapete. De Vikings vixens visigodos e dervixes. Entreolhamos.

Aa caráter avança aos restos, ao lixo, costumeiro. Deixo o banquete, avanço conjunto. Alimento dos impróprios, dos vassalos, de nós dois. Beiro o paralelo, me encho de pelos, arfo, rosno, cumprimento o meu dono. Livre, deixo a casa ao novo morador. Para amanhã voltar, e recomeçar na linha um.





segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Lenga nº 171 - Mala



Ergue
se
O pendão contínu
...ooo...
Dum velho jeito brasileiro
De querer-se
ser
Mala(ndramente)
Perdedor consciente

Assim sigo poeta
mente
incólume der-r-ot
ista,
E tão outros
tistas
Amém.
(te)

domingo, 18 de setembro de 2011

o outro, o eu, o débito

Andre Kertesz _ Shadow Self Portrait



o inferno com cheiro de jasmim e anil morre e encerra em si todo o nome
[da ignorância
seja ele um não saber seja ele o não saber é aquilo
[que não tem resposta
pras coisas feitas sem ser si no inferno, na verdade, não tem cheiro, cor, rastro
o inferno não tem memória
Acorda todos os dias em nós e desperta de súbito, sem vermos
Então pagamos seu preço, sem culpa, culpados
Todos os dez vinténs.

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Talvez por isso se precise de homen fortes e que chorarão na hora da sombra. Com seus chocalhos, feitos por seus pais. Com sua Força, feita por seus pais e consumida pelo mundo.
É por ignorância sim, que todo o inferno do outro, é em si não um cheiro, mas uma potência de cheiro. É por Não ter respostas que criamos essa fantasia e balançamos nosso presente barulhento, fazendo um barulho que evocará de nós a nossa própria hora da sombra.
Evocará o mal do mundo pela mão do mundo numa pergunta que responde o mundo. De um modo que o pedido seja da vontade de si, e de nem um outro a caminhar por suas mãos. O rastro é de quem deixa o rastro. A mão é a de quem levanta a mão e a vontade também. O inferno aparecerá, sim, um dia, em todos nós.
O inferno frio, o inferno frio, o inferno frio.
Se assim for, pela mão de quem tem vontade, que ele apareça, que se lembre, que se fale, que se deseje o próprio inferno. Não de si, mas dos outros, não dos outros mas de si. Que o pesadelo seja consciente e a dor na carne seja consciente. Que o débito seja pago com sangue. Sangue consciente,  e então o choro invada, mas um choro consciente, vindo sem embargo, mas por desejo.
Que a sombra inunde, então, o homem consciente na hora da sombra. Um homem sem débitos de vintém algum, sem culpa que não a sua de ser si. Que a sombra envolva sua força e chocalho e sua sorte. Que a força e a lágrima corram pelas mãos da sombra. Sem cheiro de mão. Pelos tentáculos da sombra. Pelos frios, frios, frios tentáculos. Sem cheiro de tentáculos. O anil sem cor, anil gelado dos olhos da sombra que engula um homem livre de si e do mundo, que o anil sem cor, anil gelado engula um homem livre de si e o outro. Que este anil venha a expelir um homem livre e consciente. Culpado, livre e consciente, de ser culpado livre e consciente. Que se devolvam os vinténs.
Que se pague os débitos com a culpa e a ignorância. Do homem que agora sabe.