sexta-feira, 18 de junho de 2010

À graça de Tália


Era uma moradora dos sonhos
Agora se confunde na teia deles
Vinda do fundo das marés
[Numa oitava mais alta
na graça, na dor, na falta de espanto
Em que encara a arte de um mundo tão concreto que a cerca
É ela o sabor dos ventos que a levam

Nesses ares, uma mistura de musas e Calipso
Confundem-se e desentendem-se homens
Pois nela não há oceano a ser navegado
Já é as correntes que guiam, a comandar naus sem escolhas

E eu. caminhante do Oneiros
[Errante observador fiel
Me satisfarei eternamente em vê-la do porto
Ou me soltar em botes por poucos instantes
Cantar-lhe uns versos e lhe dedicar meus brindes

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Ofício



Levantei no domingo como quem levita da cama. A janela mostrava uma profusão de cores num pantone que não conseguia descrever. Saí sem me lavar, seguindo até a padaria numa das quatro esquinas que me rodeavam, comprei-me um maço de vinte literatos para explicar-me o dia melhor. Ao acender o primeiro percebi que o dourado matinal, se tranformando num anis calmo e eterno, rodeado por nuvens algodoadas já havia sido escrito algumas centenas de milhares de vezes. Meia-volta, café, pães, lotações apinhadas, frio matinal entrando pelo casaco, mais um passo e o sedã vermelho quase me tira o suspiro. Acendi o segundo e formulei uma boa narrativa sobre a morte eminente e os seundos que se tornam décadas antes do golpe, de um homem jovem e que poderia melhorar sua existência, eliminar qualquer procrastinação, alguém já escreveu e o senso comum se apoderou por clichê, cabeceei o poste, esqueci do nome da personagem e da bela senhorita que ele se declararia depois do devaneio em que conversava com Hades. Pena não poder amassar o papel ou deletar o arquivo, um dos maiores prazeres de um escritor ruim, como uma explicação para a falta de técnica, o papel em branco diz que o mundo pode ser novo.
Falando em pena, compro-me uma após o almoço, piedade com cerdas e ponta fina número seis. A tinha perdido depois de matar meu serralheiro poeta em um de meus contos, a golpes de formão e furos de furadeira. Agora poderia vender alguns finais felizes, ao modo das boas novelas. O problema é segurar os heróis separados até o fim do texto. Acendo o sexto literato e resolvo amassar o papel, ou talvez a escrivaninha. Resolvo voltar a meus dois litros de café e ao fantasioso nonsense, a cama me chama e sonho amassando alguns quadros de Dali e desenhando obsenidades em outros, pra tirar o surreal dali. Ao me levantar novamente escuto alguns violões dos vizinhos abaixo, alguns gritos e o barulho de copos a bater, penso estar sozinho. A escrivaninha me chama pra falar da solidão, sentimento necessário pra qualquer escritor que queira ser legal, imagino-me sozinho andando pelas ruas, narrando as coisas que só quem anda por si só pensa, abri uma garrafa de estilística para me aprofundar e quando dei por mim, já estava no apartamento de baixo cantando alguns clássicos da década passada e me embebedando com os vizinhos.
Ao retornar resolvi terminar o ofício, idealizei uma mulher na cama, porém não consegui me decidir por morena em curvas e pecados, alva como a musa de um cavaleiro medieval.Como estava sem fogo para um último literato, não dicerni bem cena alguma e quando percebi, havia dormido com uma vaca holandesa malhada.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Á frô (numversomaió)


A Frô se abre num sorriso
Pétala por pétala , bêja meus óio, meu sór, meu dia
Nessa única manhã que o tempo me deu
Irradia um brio da frô e me pregunto,
Pra quê lua?

Dum sarto, que me veio nas vista
Da coroinha branquinha, do miolim marelo
Enchê meus óio, me esqueceno o aluá
E me lembrano das coisa boa da vida

E me pego apreguntano as veis
Se a mema frô que abraça o horizonte
E dá o chêro de novo no dia
Vai ficá lá em riba preu adimirá
Ou vai descê preu senti o prefume daqui

E si num descê, eu digo cá procê
Qui lua tomém num desce
Mais num chera qui nem frô de laranjeira
Mais num chera qui nem frô de laranjeira

terça-feira, 8 de junho de 2010

Onçaborboleta


Dança a borboleta numa árvore daqui do jardim
Ou é o jardim que dança perto da borboleta?
Seus voos causam furacões
[e assim
Penso na braveza de onça, naqueles olhos puxadinhos
Penso que o sol também dança ao redor da borboleta
Observo sua volta e sua ida e sua vinda
Me alegrarem mais um dia

Meu amigo Senhor Poste!

Quando me vi sendo cumprimentado por um poste aas quatro da manhã, entendi que havia cometido mais um excesso de sábado.
_ Boa noite meu jovem! _ me disse naquele sotaque português meio forçado. Sentei-me ao seu lado para descasar da longa caminhada de duas esquinas que me separavam do Amarelinho.
_ Noite sêu poste _ respondi sem lhe olhar ao rosto. Ficaria meio zonzo se me voltasse para cima.
_ Que estranho me pareces... Não lhe espantas que um poste fale contigo??? _ olhei-o no rosto enfim, rodando um pouco os córneos ao ritmo da imagem _ Não, de forma alguma. Semana passada me falou uma lixeira, num baianês rápido e ininteligível. Melhor o senhor que pelo menos entendo...
Por alguns segundo olhei para o chão e me senti sozinho. Havia brigado com um de meus melhores amigos por causa de um mísero ultimo amendoim da mesa! Era umcrápula... um crápula. O poste continuava lá, espantado ainda
Pus a mão no bolso da camisa, retirei minha carteira de cigarros e o isqueiro num movimento reflexo.
_ Dai me um que o dia foi longo. Quase que um azelha me bate com uma carocha e me parto aos retalhos _ Não entendi lhufas, mas ser um poste é algo que deve cansar. Dei-lhe um cowboy e o acendi. O poste então resolveu se sentar ao meu lado. Pude ouvir os fios sendo se esticando e me vali de certa preocupação, me contive um pouco, seus olhos estavam caidos como os de um operário. Puxei um papo para nos distrairmos.
Começamos a falar sobre futebol: A Portuguesa enquanto símbolo da cultura lusitana no Brasil e o fato de que nesta cidade poucos torcem para times deste estado. A cerveja encarecendo gradativamente ao longo do tempo e como as mulheres têm comprado bolsas maiores e cachorros menores, como se fossem fazer uma criação de poodles dentro daquelas monstras de pano/couro, frivolidades e coisas sérias. Contei-lhe de minhas mesquinhices e dificuldades e ele das dele. Não tem como descrever o quanto é profunda a alma de um poste, suas preocupações e anseios!
Quando o sol começou a incomodar meu olho avermelhado, me dei conta do passar das horas e tive de me levantar e me despedir. Foi um dos melhores papos da minha vida.

Quem sabe semana que vem eu não encontro alguma torre telefonica gente fina?

Publicado em http://www.fotolog.com.br/redlobster01/38464251 , em 18/08/09

quinta-feira, 3 de junho de 2010

À Frô

A Frô se abre num sorriso
Pétala por pétala , bêja meus óio, meu sór, meu dia
Nessa única manhã que o tempo me deu
Irradia um brio da frô e me pregunto,
Pra quê lua?

terça-feira, 1 de junho de 2010

Encalacrado

Segura-te a sede de verbo, boca maldita!
Que o açoite é a sorte do espanto
Que o chão é a moléstia do encanto
E quem conta um conto, sabe a garganta que tem